O perigo dos agrotóxicos
Anvisa revelou que 36% das amostras de alimentos
estavam impróprias para o consumo
Fernando
Carneiro
O agronegócio
brasileiro vem pressionando a Presidência da República e o Congresso para
diminuir o papel do setor de saúde na liberação dos agrotóxicos. O Brasil é o
maior consumidor desses venenos no planeta e a cada dia se torna mais
dependente deles. Qual o impacto que essas medidas terão na saúde da população
brasileira?
No Brasil, a cada
ano, cerca de 500 mil pessoas são contaminadas, segundo o Sistema Único de
Saúde (SUS) e estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os brasileiros
estão consumindo alimentos com resíduos de agrotóxicos acima do limite
permitido e ingerindo substâncias tóxicas não autorizadas.
Em outubro, a Agência
de Vigilância Sanitária (Anvisa) revelou que 36% das amostras analisadas de
frutas, verduras, legumes e cereais estavam impróprias para o consumo humano ou
traziam substâncias proibidas no Brasil, tendência crescente nos últimos anos.
Os agrotóxicos afetam
a saúde dos consumidores, moradores do entorno de áreas de produção agrícola ou
de agrotóxicos, comunidades atingidas por resíduos de pulverização aérea e
trabalhadores expostos. Mesmo frente a esse quadro, mais dramática é a ofensiva
do agronegócio e sua bancada ruralista para aprofundar a desregulamentação do
processo de registro no país.
Qualquer agrotóxico,
para ser registrado, precisa ser analisado por equipes técnicas dos ministérios
da Agricultura, Saúde e Meio Ambiente. Inspirados na CTNBIO, instância criada
para avaliar os transgênicos, que até hoje autorizou 100% dos pedidos de
liberação a ela submetidos, os ruralistas querem a criação da CTNAGRO, na qual
o olhar da saúde e meio ambiente deixaria de ser determinantes para a decisão.
Quem ganha e quem
perde com essa medida? Não há dúvida que entre os beneficiários diretos está o
grande agronegócio, que tem na sua essência a monocultura para exportação. Esse
tipo de produção não pode viver sem o veneno porque se baseia no domínio de uma
só espécie vegetal, como a soja. Por isso, a cada dia, surgem novas
superpragas, que, associadas aos transgênicos, têm exigido a liberação de
agrotóxicos até então não autorizados para o Brasil. O mais recente caso foi a
autorização emergencial do benzoato de amamectina usado para combater a lagarta Helicoverpa, que
está dizimando as lavouras de soja de norte a sul do país. A lei que garantiu a
liberação desse veneno tramitou e foi aprovada em um mês pelo Congresso e pela
Presidência da República.
A pergunta que não
quer calar é: no momento em que a população brasileira espera um Estado que
garanta o direito constitucional à saúde e ao ambiente, por que estamos vendo o
contrário? Na maioria dos estados brasileiros os agrotóxicos não pagam
impostos.
O Estado brasileiro
tem sido forte para liberalizar o uso de agrotóxicos, mas fraco para monitorar
e controlar seus danos à saúde e ao ambiente. Enquanto isso, todos nós estamos
pagando para ser contaminados...
*Texto publicado no jornal O Globo em 24/01/14.
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