segunda-feira, 21 de maio de 2012

As Duas Espécies de Desenvolvimento


As Duas Espécies de Desenvolvimento

Adalberon Bezerra Filho, na divertida história Volta às Aulas (capítulo de seu livro Conto e Reconto), revela-nos a dupla manifestação do desenvolvimento. Há um desenvolvimento que, nascido da ganância humana, provoca a destruição ecológica e agrava ainda mais o sofrimento de quem vive na região por ele atingida.
Por outro lado, há um desenvolvimento – o único, na verdade, que merece esse nome - que leva em conta a Natureza e os apelos da comunidade. Desconcertante é saber que esta espécie positiva de desenvolvimento só ganha voz e expressão na figura de um menino incógnito que, aparentemente infenso aos bancos escolares, mostra-se, contudo, de uma sensibilidade há muito extinta nos homens que detêm o poder e o conhecimento. (N. do E.)

Volta às Aulas

Adalberon Bezerra Filho

        
        O professor Danilo entrou em sala dizendo:
- Vamos fazer redação.
         Logo levantou a mão em protesto o Maicon, objetando que desde criança, nessa data, o professor sempre vem com esse papo sinistro, tipo assim: escreva sobre como foram as suas férias. Que saco! Fala sério!
E completa o professor:
 - Imagine pra mim, que tenho ainda que ler, corrigir e comentar o resultado de sua má vontade de redigir sobre qualquer que seja o assunto. Mas não vou pedir isso não. Vocês têm sorte. Primeiro, hoje eu vou contar uma história de minhas férias.
E passou a narrar:
Desde quando ainda garoto, passávamos, eu e minha família, férias na cidadezinha onde meu avô tinha uma casinha. Itaúna, como era chamada pelos praianos antigos, era desconhecida da gente da capital. Certo dia aconteceu o que entendemos como:
         “Consequências de um desenvolvimento”.
         Vou narrar um pequeno trecho do que ocorreu em uma humilde comunidade em consequência de um desenvolvimento.
         Numa bela e ensolarada manhã de início de verão, chegou ao pacato e ordeiro lugarejo de Pedra Negra um tal desenvolvimento.
         As máquinas e os tratores começaram a trabalhar a toda força e abriram, imediatamente, no meio do coqueiral e à beira do manguezal, uma larga avenida.
         Os habitantes do lugar ficaram espantados com a agressividade e a avidez com que agia aquele grupo de invasores. Engenheiros, técnicos e operários armados com mapa, fita métrica e outras ferramentas, transformavam todo o ambiente em nome do progresso.
         Não demorou muito e logo apareceu à frente do grupo o prefeito, que, orgulhoso, esclareceu às equipes de repórteres e curiosos:
- Povo de Pedra Negra e estimados visitantes! Graças ao nosso protetor, o senhor excelentíssimo doutor governador, sairemos em breve da pobreza em que vivemos.
         Dias depois estava concluída a rodovia que ligava a bela região litorânea à capital do estado. E, na praia mais bonita, um enorme loteamento foi traçado, no pátio da aldeia uma grande e ajardinada praça foi construída com lindas casas de veraneio em volta e o lugar passou a ser chamado de Condomínio Atlântico.
         Logo depois disso, Pedra Negra viu nascer o seu primeiro clube náutico, um grande hotel resort e ainda shopping center; surgiram também bares, restaurantes e discotecas para turistas.
         Por fim, os agricultores tiveram que trocar suas terras à margem do rio por outras mais distantes do centro urbano ou foram morar no mangue ou nas encostas dos morros; a colônia dos pescadores mudou-se para fora da aldeia uns cinco quilômetros acima; as mulheres artesãs passaram a ser serviçais das casas de veranistas, assim como as crianças que deixaram de aprender o ofício dos pais, para também se agregarem às famílias visitantes, prestando-lhes pequenos serviços.
O pequeno antigo comércio local progrediu modernizando-se, enquanto a escolinha e o posto de saúde continuam os mesmos de antes.
         Contudo, o médico já fica no balneário durante todo o verão, apesar de reclamar do ambulatório e do salário.
         O prefeito diz que se for reeleito, na sua próxima administração, fará um hospital e mais escolas.

E continuou o professor:
- Os antigos, entre os quais me incluo, estamos saudosos daquela Itaúna de outrora. Gostaríamos que a história fosse outra, com final feliz para todos.
Terminada a aula, deixou, como tarefa para a próxima, uma redação com tema livre.
Na aula seguinte, tamanha foi sua surpresa ao receber o trabalho de Maicon  que já impressionava pelo título, e, de imediato, passou a ler em voz alta:
“Circunstâncias para um desenvolvimento”
Esta pequena passagem fala sobre o que ocorreu em uma humilde comunidade como circunstâncias de um desenvolvimento.
         Numa escura e fria manhã de chuvoso inverno, chegou ao pacato, tristonho e monótono lugarejo de Pedra Negra, o tal desenvolvimento.
         As equipes de saúde e de educação começaram a trabalhar a toda força e abriram, imediatamente, no meio do coqueiral e à beira do manguezal, em mutirão, uma grande esperança.
         Os habitantes do lugar ficaram espantados com a boa vontade e a dedicação com que atuava aquele grupo de agentes. Médicos, professores e voluntários, munidos de remédios, livros e outros instrumentos, transformavam todo o ambiente em nome do bem-estar de todos.
         Não demorou muito e logo apareceu à frente do grupo o prefeito, que, orgulhoso, esclareceu aos moradores:
- Povo de Pedra Negra e estimados visitantes! Graças ao nosso Protetor, e com a união de nosso trabalho, sairemos em breve da pobreza em que vivemos.
         Dias depois estava concluída a rede de esgoto e de saneamento e montado um equipado posto de saúde que atendia a mais bela região litorânea do estado. E, na praia mais bonita, uma enorme vila de casas populares foi erguida, no pátio da aldeia, uma grande e ajardinada praça foi construída com igreja, biblioteca e cooperativa em volta, e o lugar passou a ser conhecido como Vila Esperança.
         Logo depois disso, Pedra Negra viu nascer ainda o seu primeiro centro esportivo, banda de música e grupo folclórico; surgiram também cursos de artesanato e profissionalizantes para os jovens.
         Por fim, os agricultores tiveram que trocar suas técnicas antigas por outras mais modernas, com sustentabilidade, à margem do rio, distantes do centro urbano; a colônia dos pescadores multiplicou-se cinco vezes mais; as mulheres artesãs passaram a se dedicar, cada vez mais, às suas artes cooperativadas, assim como as crianças, que se empenharam em aprender o ofício dos pais, garantindo-lhes também a continuidade de suas obras.
O pequeno antigo comércio local progrediu, enquanto a escolinha e o posto de saúde acompanhavam o crescimento, expandindo-se e informatizando-se.
Contudo, os médicos já ficam no balneário durante o ano todo, apesar de todos estarem vacinados e haver poucos doentes, graças à prevenção de doenças.
         O prefeito diz que, se a verba do orçamento for suficiente, na sua próxima administração, executará novos projetos sociais.
Deslumbrado e esperançoso, o professor instigou a turma a buscar redigir projetos de desenvolvimento que atendessem às necessidades da comunidade e que promovessem a sua sociedade.

domingo, 13 de maio de 2012

Sensibilidade Materna X Insensibilidade Médica


Sensibilidade Materna 
Insensibilidade Médica

“Aos oito anos eu ainda não sabia ler, e a escola perdeu a paciência comigo. Disse para a minha mãe que eu tinha problemas de aprendizagem e me mandou procurar um médico. Os exames deram que eu tinha retardo mental, que deveria tomar remédios fortíssimos. O que minha mãe fez? Ignorou tudo, não me deu remédio e me tirou da escola. Ela sabia que eu só tinha um ritmo diferente. Ela mesma me alfabetizou fazendo um quebra-cabeça de palavras. Passei a tirar notas boas em português e quando cresci, virei escritor.”               
 Fabrício Carpinejar, escritor