domingo, 12 de junho de 2011

Por que Abandonei a Dieta Macrobiótica em prol do Princípio Unificador

Metamorfose 12
Publicação do Restaurante Metamorfose Alimentação Recondicionadora Autêntica
Rua Santa Luzia 405/207, Castelo, Rio de Janeiro. Tels.: 2262-6306 e 2532-0084
Edição, redação, revisão e tradução: Laercio de Vita



Quando Carl Ferré, presidente da George Ohsawa Macrobiotic Foundation e editor da Macrobiotics Today, vem a público dizer que abandonou a dieta macrobiótica, o mínimo que devemos fazer é dar-lhe ouvidos.
Na verdade, o alvo de Carl é certa macrobiótica apartada da vida (e, em tese, apartada dos princípios macrobióticos); ou seja, uma macrobiótica desintegrada e desintegradora.
Carl confessa que o medo e o seguir mecanicamente a dieta só o levaram ao enfraquecimento. Era a vida enviando-lhe sinais de que era necessário mudar. Mas que rumo tomar? Como saber qual o melhor caminho para si próprio?
A resposta está em desenvolver a nossa intuição, talvez o objetivo principal da verdadeira macrobiótica (Ohsawa já falava de uma Educação da Vontade).
Embora reconheça a intuição como uma força poderosa na macrobiótica, Carl não nos dirige sequer uma palavra a respeito de como desenvolvê-la. Frustrando-nos, apenas promete dedicar-se ao assunto num futuro próximo.
Enquanto aguardamos o artigo de Carl acerca de tema tão importante, ofereço-lhes um trecho que trata do contraste entre a síntese intuitiva e a análise intelectualista. Quem o assina é Masanobu Fukuoka:
“O progresso na medicina tem-nos trazido uma grande quantidade de terapias através de dietas, tais como dietas de baixa caloria para pessoas que querem perder peso, dietas leves para pessoas com problemas de estômago, dietas com pouco sal para pessoas com problemas de rins e dietas sem açúcar para pessoas com doenças pancreáticas. Mas o que acontece quando uma pessoa tem problema em dois ou três órgãos? Se este alimento não pode e aquele está proibido, então o pobre amigo – não podendo comer qualquer coisa – poderia acabar tão magro e seco quanto uma sardinha.
É um erro acreditar que como os avanços são feitos numa ampla extensão de áreas altamente especializadas, o alcance das aplicações aumenta. Não deveríamos esquecer que quanto mais altamente especializada for uma pesquisa, mais ela se afasta da perspectiva do todo.
Em uma era antes do desenvolvimento da ciência da nutrição, antes de dispensarmos qualquer pensamento sobre o que era bom ou ruim para nós, tudo o que sabíamos era que, para ficarmos saudáveis, deveríamos comer com moderação. Qual tem aplicação mais ampla? Qual é mais eficaz? A ciência da nutrição moderna com sua pesquisa especializada ou as advertências tradicionais de moderação? A ciência da nutrição moderna pode parecer ter uma aplicação mais ampla porque ela considera todos os casos. No entanto, ela proíbe primeiro uma coisa, depois outra, e as pessoas ficam se batendo nas paredes e lutando com muitos problemas novos. Simples mas completo, o conhecimento de que se deve comer com moderação aplica-se a todas as pessoas e, portanto, funciona melhor. Isto é assim porque o conhecimento que é menos discriminatório tem uma aplicação mais ampla.” (N. do E.)




Por que Abandonei a Dieta Macrobiótica em prol do Princípio Unificador
                                                                                                                            Por Carl Ferré
                                                                      


No meu caso, a dieta macrobiótica não funcionou. E olhem que observei estritamente a dieta estândar, abrindo mão dos alimentos tidos como impróprios. Depois de anos seguindo o regime padrão, vi-me, contudo, sem energia, sem forças para correr e com vários problemas de saúde. Perplexo, interroguei-me: era a minha condição o resultado de uma prática desastrosa ou a consequência de uma dieta que de fato não funcionava?

A Dieta Macrobiótica Estândar

Minha conclusão, após anos de prática, é que a dieta macrobiótica estândar tanto nos pode ser útil como prejudicial. Ela é útil, porque qualquer um pode compreendê-la e segui-la. Estão excluídos da dieta os alimentos tratados quimicamente ou excessivamente processados, como o açúcar refinado. Evitar tais alimentos conduz grande parte das pessoas a uma condição saudável.  Daí apressadamente concluírem que o que se deve fazer para afastar a doença é ingerir os alimentos permitidos e abster-se dos proibidos.
A dieta macrobiótica estândar é altamente prejudicial quando resistimos a mudanças ou recusamos ajuda qualificada, acreditando cegamente que a ingestão dos alimentos permitidos nos levará eventualmente à cura. Foi isso que aconteceu comigo. Eu estava convencido da minha melhora. O universo dirigia-me sinais de que era preciso mudar, mas eu teimosamente mantinha-me firme na dieta padrão. Outro fator prejudicial é o medo infundado de certos alimentos.
A dieta macrobiótica estândar está para a verdadeira macrobiótica assim como as rodinhas laterais estão para a prática de andar de bicicleta. Logo que conseguimos nos equilibrar, descartamos as rodinhas. Se as instalamos de novo, elas, em vez de ajudar, atrapalham. Dá-se o mesmo com a dieta macrobiótica estândar. A partir do momento em que aprendemos a usar os princípios macrobióticos, passamos a fazer as nossas próprias escolhas, em vez de seguir cegamente a dieta prescrita.
A primeira vez que uma criança anda de bicicleta sem as rodinhas, tem ela a seu lado os pais ou um amigo, que a encorajam durante certo tempo até que se sinta segura o bastante para que os adultos a deixem ir livremente. Na macrobiótica, este encorajamento constitui o trabalho dos educadores, orientadores e amigos macrobióticos.
Em lugar de continuar enfatizando a macrobiótica estândar, ou mesmo a dependência à opinião de outrem, precisamos estimular as pessoas a abandonarem as rodinhas laterais e a confiarem em seu próprio julgamento. Os princípios macrobióticos não são difíceis de aprender, e cada um de nós guarda em si uma poderosa intuição. Devemos com ela aprender, nela confiar e dela usufruir.
Logo que abandonei as rodinhas laterais (a dieta macrobiótica estândar) e aprendi a usar os princípios macrobióticos e a confiar em mim mesmo, o medo foi desaparecendo. E com ele as doenças! Continuei seguindo os princípios tanto na seleção do alimento diário quanto na de outras práticas saudáveis, e já não temo qualquer alimento da lista proibida. Hoje desfruto a vida sem as rodinhas laterais.

A Dieta de Prevenção ao Câncer

A dieta de prevenção ao câncer é similar à dieta macrobiótica estândar – ambas desenvolvidas por Michio e Aveline Kushi. A única diferença entre as duas é que a primeira se dirige às pessoas com a doença ou com medo dela. Ou seja, são as rodinhas aplicadas a uma condição específica.
Um de nossos leitores enviou-me um trecho da mais recente edição de Cancer Prevention Diet de Michio Kushi, e pediu um comentário sobre as recomendações para o século XXI nela veiculada. Aqui está o excerto:
“Para dar conta das constantes mudanças atmosféricas, ambientais e sociais, vários ajustes – nas recomendações dietéticas, nas compressas e nos outros tratamentos caseiros – foram incorporados a esta nova edição. Tais adaptações representam a resposta à hoje frenética energia ambiental e à crise da qualidade dos alimentos. O aquecimento global, a poluição, os organismos geneticamente modificados, os telefones celulares e o declínio na qualidade dos alimentos (incluindo a perda estimada de 25 a 50% dos nutrientes da maioria dos vegetais e frutas) exigem mudanças importantes na culinária macrobiótica, nos cuidados com a saúde e na cura. O planeta tornou-se mais quente e a tecnologia introduziu-se mais difusamente em nossas vidas – Internet, celulares, iPods. Como o ritmo da vida disparou, as pessoas tornaram-se mais exaltadas, mais tensas e mais inflexíveis no pensamento e na atitude. Para contrabalançar esta tendência yanguizante, que conduz a uma vida mais difícil, agitada e estressante, o alimento diário precisa ser mais leve e relaxador. Consequentemente, arroz e outros grãos cozidos à pressão – pedra angular da culinária macrobiótica – devem dar lugar, proporcionalmente, a grãos cozidos em panela comum ou no vapor. Grãos partidos também devem ser mais usados que outrora, tendo em vista a energia mais leve que contêm. É conveniente ainda que saladas e frutas frescas, sucos, óleos, sobremesas e outros alimentos sejam ingeridos com mais frequência do que antes. Os cardápios e receitas desta edição refletem essa tendência.”
Tiro o chapéu para Michio por ele entender que “mudanças importantes na culinária macrobiótica, nos cuidados com a saúde e na cura” são imprescindíveis. Suas análises e conclusões são, de um modo geral e tanto quanto posso divisar, precisas. O problema é a natureza prescritiva das recomendações.
Muitos de nós, baseados em condições pessoais e ambientais, e atentos aos princípios macrobióticos, abandonamos há tempos o arroz integral cozido à pressão. Começamos também a ingerir mais saladas frescas, frutas da estação e sucos. Alguém que está seguindo os princípios macrobióticos e confiando em seu próprio julgamento já fez os ajustes necessários. Alguns precisam de alimentos mais leves; outros, de alimentos mais concentrados. E não esqueçamos que isso pode mudar de dia para dia, de semana para semana, de mês para mês, de estação para estação, de ano para ano.

Como saber o que é melhor?

Em primeiro lugar, aprenda os princípios macrobióticos. Em segundo lugar, aprenda a confiar em sua intuição. Em terceiro lugar, aprenda a reduzir o medo.
Eis aqui a relação dos principais ensinamentos de George Ohsawa:
A Ordem do Universo
As Sete Leis da Ordem do Universo
Os Doze Teoremas do Princípio Único
As Sete Condições de Saúde
Os Sete Estágios da Doença
Os Sete Estágios do Julgamento
A Ordem do Universo revela-nos a nossa origem (donde viemos, a fonte de todas as coisas). As Sete Leis e os Doze Teoremas, ao lado das Sete Condições de Saúde e dos Sete Estágios da Doença, dão-nos as ferramentas necessárias para viver sobre a Terra. Os Sete Estágios do Julgamento elucidam a viagem de volta à nossa origem, da qual nunca realmente nos separamos. Quanto mais nos conectamos com a fonte de tudo, mais desenvolvemos nossa habilidade intuitiva e mais superamos o medo.
Confiar na intuição pode ser revolucionário. Nós temos medo de fazer a coisa “errada” e acabamos por imaginar várias hipóteses. Uma estratégia para mudar este tipo de pensamento é prestar mais atenção àquilo que realmente sentimos. Devemos ouvir a voz interior, que nos adverte quando há perigo e nos encoraja quando “sabemos” que estamos fazendo a coisa “certa”. O desenvolvimento da intuição constitui um assunto muito amplo. Planejamos abordar mais este tema no futuro.
Enquanto isso, cito um pequeno trecho de minha esposa, Julia, acerca da redução do medo. “Medo é o que fundamentalmente nos move sobre a Terra. Entre o medo e o amor, o primeiro quase sempre governa. Materializamo-nos para compreender isso, e posteriormente aprender a viver sem deixar que o medo nos domine. Sejamos, em vez de escravos do medo, libertos do amor.”

Mantendo a Macrobiótica Viva

Segundo Ohsawa, o objetivo da macrobiótica é auxiliar-nos a alcançar a autorrealização. Pouco antes de sua morte, entretanto, o sensei lastimou que nenhum de seus discípulos compreendeu-lhe integralmente os ensinamentos.
Ohsawa acreditava que a falta de entendimento se devia ao que ele denominou “pensamento enevoado”. E conforme teorizou, tal pensamento era o resultado de uma saúde precária, que, por sua vez, advinha de uma escolha equivocada dos alimentos. Por isso, os escritos de Ohsawa começaram a apresentar instruções específicas sobre dieta e saúde, ao lado de lembretes sobre os princípios universais. Na verdade, para ele, prática (dieta) e teoria (princípios) eram inseparáveis. Prática sem teoria é perigoso. Teoria sem prática é inútil.
Os anos 1960 e 1970 viram a teoria e a prática macrobióticas florescerem. As duas maiores mudanças ocorreram nos anos 1980 – a introdução da dieta macrobiótica estândar e o surgimento de uma dieta macrobiótica específica para o câncer. Dá-se hoje muita ênfase à dieta e cura e pouca ou nenhuma ênfase à teoria. Creio caber aos orientadores mais antigos (aqueles que iniciaram o movimento nos anos 1960 e 1970) corrigir esta situação.
Há uma tendência nesta direção após décadas de encontros e projetos. Há agora um encontro anual sediado em Portugal, a cada outono, de antigos professores macrobióticos; sem falar das conferências do Instituto Kushi e dos Acampamentos da George Ohsawa Macrobiotic  Foundation. Os resultados estão começando a aparecer.
A saúde da macrobiótica como movimento não difere da nossa saúde individual. No meu caso, aprendi os princípios primeiro, mas depois passei a seguir uma versão estática e prescritiva da macrobiótica. Só obtive melhora quando adotei uma prática fundamentada na teoria macrobiótica, desvencilhando-me das rodinhas laterais - ou seja, quando deixei de seguir cegamente a dieta estândar.
A interpretação da macrobiótica levada a efeito por Ohsawa teve início nos anos 1920 com os princípios. Seguiu-se um período de relativo equilíbrio entre teoria e prática nos anos 1960 e 1970, e a macrobiótica então floresceu. De 1980 a 2000 verificou-se o predomínio da prática (dieta) sobre a teoria (princípios). O curandeirismo talvez tenha se beneficiado com isso. Mas, em minha opinião, o verdadeiro progresso só virá a partir do retorno a uma apropriada ênfase nos princípios e nos objetivos mais amplos da autorrealização.








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